Skip to main content

EDITORIAL

Quando o Rock in Rio abriu suas portas pela primeira vez em 1985, era claro o que o público esperava: um show de música icônico, com performances inesquecíveis de artistas de todo o mundo. Décadas depois, o festival mantém sua grandiosidade, mas a presença cada vez mais marcante de marcas e anunciantes levanta uma questão: o Rock in Rio ainda é sobre música, ou se tornou um palco de marketing?

Na última edição do festival, o público foi impactado por uma infinidade de ativações de marcas que competiam por atenção tanto quanto os artistas no palco. Desde estandes interativos de grandes patrocinadores até logotipos estrategicamente posicionados em todos os cantos da Cidade do Rock, as marcas se tornaram uma parte integral da experiência. De bancos a operadoras de celular, passando por marcas de bebidas, cosméticos e até mesmo redes de fast-food, a sensação é que o Rock in Rio virou um imenso outdoor a céu aberto.

A experiência imersiva oferecida pelas marcas não é necessariamente uma novidade, mas a escala e a complexidade dessas ações parecem estar atingindo um novo patamar. Para muitos visitantes, as ativações são uma extensão do entretenimento: áreas de descanso estilizadas, brindes personalizados, sorteios e experiências exclusivas acabam se tornando parte do que define o evento. No entanto, há quem veja esse excesso de publicidade como um desvio da essência do festival.

O que antes era um espaço para expressão musical agora se mistura a um ambiente corporativo, onde as marcas buscam se conectar emocionalmente com o público jovem e engajado. As ativações visam criar um elo que vai além da música, transformando o espectador em um consumidor ativo, muitas vezes sem que ele perceba. Um estudo da Fundação Getulio Vargas apontou que o retorno sobre investimento para as marcas presentes no Rock in Rio pode ser significativamente maior do que em campanhas publicitárias tradicionais, graças à conexão emocional estabelecida no festival.

Para os organizadores, essa parceria com marcas é essencial para viabilizar o evento em sua magnitude, proporcionando a infraestrutura necessária e atrações que mantêm o Rock in Rio entre os maiores festivais do mundo. Roberto Medina, criador do evento, já declarou que o patrocínio das marcas é fundamental para manter o nível de produção, desde a qualidade do som até as estruturas de segurança.

Por outro lado, o público mais purista sente saudades de um Rock in Rio que era, acima de tudo, um festival de música. Nas redes sociais, críticas à “mercantilização” do evento são frequentes, com fãs apontando que o festival se tornou mais um show de marcas do que um palco de expressões artísticas genuínas.

Em última análise, a convivência entre o mundo da música e o marketing parece ser um reflexo do tempo em que vivemos, onde a linha entre cultura e consumo está cada vez mais tênue. O Rock in Rio segue sendo um espetáculo, mas a pergunta que fica é: até onde vai o show de rock e onde começa o show das marcas?

Se a experiência do público está sendo enriquecida ou diluída, isso dependerá do ponto de vista de cada um. O certo é que, no Rock in Rio, a música e as marcas dividem o palco principal, e não há sinais de que essa dinâmica vá mudar tão cedo. Afinal, na Cidade do Rock, o show nunca para — e as marcas também não.